domingo, 29 de janeiro de 2017

Metformina: uma sexagenária em plena forma

A metformina foi lançada para o tratamento do diabetes mellitus tipo 2 (DM2) há quase 70 anos. Nesse período todo, essa medicação sexagenária tem sido ferramenta muito importante no controle de uma das doenças mais prevalentes em todo o mundo. Embora descoberta na década de 20, derivada de uma planta chamada de arruda-caprária ou galega (Galega officinalis), a metformina foi lançada nos anos 50 pelo cientista francês Jean Sterne, que a chamou de “comedora de glicose”. A sua grande capacidade de reduzir os níveis de glicose, a capacidade de não aumentar o peso (até pode reduzir), a baixa incidência de efeitos colaterais e o seu baixo custo tornaram a metformina uma medicação muito popular nas receitas de quem tem diabetes. Aliado a isso, a metformina está no grupo de medicamentos que, além de baixar a glicose, também tem um efeito protetor do coração. Pacientes que tem DM2 e usam metformina têm uma redução significativa na mortalidade por doenças cardíacas. Isso colocou o medicamento no topo da lista e o tornou a primeira escolha para quem tem DM2. Quanto mais tempo usar, mais proteção terá, por isso a recomendação é que se inicie a metformina no momento em que se faz o diagnóstico do DM2, sempre aliado às mudanças do estilo de vida.



O principal mecanismo de ação da metformina envolve facilitar a ação da insulina em seus receptores. Isso resulta em diminuição da produção de glicose pelo fígado, redução da absorção intestinal de glicose e aumento da sua captação nas células. Para melhor controle do diabetes, geralmente a metformina é usada em associação com outras medicações anti-diabéticas. Muitas novas medicações para o diabetes surgiram nos últimos anos, mas a metformina continua sendo a base eficaz no tratamento do DM2.

O que é importante saber sobre o uso da metformina?

1. Qual o melhor horário para tomar a metformina?
Por causa da possibilidade de náuseas e/ou dor abdominal no início do tratamento, recomenda-se tomar os comprimidos de metformina junto ou logo após a refeição. Daí a tolerância é melhor. Depois do organismo estar acostumado ou se nunca teve nenhum efeito colateral, a medicação pode ser tomada antes da refeição, conforme a preferência de cada pessoa. Particularmente, sempre recomendo manter o uso após a refeição.
2. Quantas vezes ao dia e qual a dose diária máxima de metformina?
A metformina pode ser usada 2 a 3 vezes ao dia (por exemplo, após café, almoço e janta). Nas apresentações de liberação prolongada (as chamadas ‘XR’), pode ser usada 1 vez ao dia, pois o seu efeito dura por 1 dia inteiro.  Os comprimidos são de 500 e 850 mg na apresentação comum e de 500, 750 e 1000 mg na apresentação de liberação prolongada. A dose diária máxima pode chegar até 2.550 mg  e recomenda-se não quebrar os comprimidos.
3. Quais os efeitos colaterais da metformina?
Os principais efeitos colaterais são gastrointestinais, isto é, náusea, vômito, dor na boca do estômago, diarreia, gases, cólica e dor abdominal. Usar após as refeições e começar com doses mais baixas pode ser uma alternativa para melhorar a tolerância. As apresentações XR, por terem liberação mais lenta, têm menos efeitos colaterais. Se os efeitos persistirem, a medicação deve ser suspensa. Cerca de 10% das pessoas não podem manter o uso da metformina, o que é uma pena, pois não se beneficiam do seu efeito cardioprotetor. Uma dica: observe se os efeitos colaterais surgiram quando a marca da metformina foi trocada, pois a qualidade do comprimido é importante.
4. A metformina causa hipoglicemia (queda da glicose)?
Não, a metformina não causa hipoglicemia. Se está ocorrendo, provavelmente é causada por outro anti-diabético oral ou insulina usados junto com a metformina.
5. A metformina pode prejudicar os rins?
A metformina não causa problemas renais. Mas pessoas que têm insuficiência renal (que os rins funcionam menos) precisam usar doses menores ou, se for uma insuficiência renal mais grave, não podem usar a metformina. Isso porque a medicação precisa dos rins funcionando para ser eliminada e caso isso não ocorra pode acontecer um acúmulo de ácido no organismo (acidose lática). A acidose lática é grave e pode levar a um sério comprometimento dos órgãos e até a morte.
6. A metformina emagrece?
Sim , esse é um efeito colateral muito bem-vindo para quem tem DM2. Entretanto, não são todas as pessoas que emagrecem. Não há indicação de uso da metformina como remédio exclusivamente para emagrecer em pessoas que não tem DM2. Cuidado!
7. Ao usar metformina XR, percebe-se eliminar o comprimido inteiro nas fezes. O que é isso?
Isso é normal. As apresentações XR são preparadas utilizando um comprimido que vai se hidratando a medida que percorre o  sistema digestivo, liberando lentamente a metformina. No final, esse comprimido pode ser visto inteiro, mas a medicação já foi liberada, o que garante o seu efeito.
8. Quais são as contra-indicações para o uso da metformina?
Insuficiência renal grave e/ou em hemodiálise; insuficiência cardíaca congestiva; situações em que pode faltar oxigênio no sangue (doenças respiratórias agudas ou crônicas; insuficiência hepática; intolerância ao uso da medicação. Antes de uma cirurgia ou durante uma hospitalização prolongada, deve-se interromper temporariamente o uso da metformina, conforme a orientação médica.
9. Por que parar a metformina quando fazer exames contrastados (tomografia, por exemplo)?O uso do contraste na veia em alguns casos pode ser tóxico para os rins, ocasionando uma parada no seu funcionamento. Como foi dito acima, se os rins pararem de funcionar, a metformina acumula no organismo e pode gerar uma complicação chamada acidose lática. Recomenda-se parar a metformina do dia do exame até 48 horas após, com controle da função renal (principalmente se já há algum comprometimento renal, mesmo que leve).
10. Posso consumir álcool usando a metformina?
Pode, mas com moderação. Recomenda-se evitar o uso frequente ou em grandes quantidades de álcool devido ao risco de acidose lática. Converse com o seu médico.

Usando de forma correta, obtém-se os melhores resultados dessa excelente medicação! Embora com tantas novas medicações para o tratamento do diabetes, viu como essa sexagenária é importante?

Referências:
1. American Diabetes Association Diabetes Care 2017 Jan; 40 (Supplement 1): S64-S74. 
2. Thomas I, Gregg B. Metformin; a review of its history and future: from lilac to longevity. Pediatr Diabetes. 2017 Feb;18(1):10-16 
3. Bonnet F, Scheen A. Understanding and overcoming metformin gastrointestinal intolerance. Diabetes Obes Metab. 2016 Dec 17. doi: 10.1111/dom.12854. 

Dr. Eduardo Guimarães Camargo
Médico Endocrinologista
CREMERS 23.404 - RQE 17.086

sábado, 21 de janeiro de 2017

Termogênicos: o que você precisa saber sobre o uso da cafeína

A utilização de suplementos alimentares, com ou sem orientação médica, está cada vez mais frequente, principalmente entre os praticantes de atividades físicas. Esses suplementos são utilizados com 3 finalidades principais: perda de peso, melhora de aptidão física e/ou ganho de massa muscular. Entre os suplementos utilizados para perda de peso e melhora do desempenho estão os termogênicos, sendo que um dos principais representantes desse grupo é a CAFEÍNA. 
O efeito da cafeína varia com a idade, o peso e a capacidade do fígado em processar a substância. Ela é rapidamente absorvida no sangue, dentro de 5 a 15 minutos após sua ingestão, e atinge seu pico de ação em 40-80 minutos, com um tempo de meia vida (tempo em que fica em circulação) que pode variar de 2 a 12 horas.



COMO A CAFEÍNA AGE NO NOSSO ORGANISMO? QUAIS SÃO OS SEUS PRINCIPAIS EFEITOS?
A cafeína pode agir no nosso corpo de 4 formas diferentes:
1. Antagonismo da adenosina:  adenosina é uma substância responsável pela sensação de sono além de ter importante função na circulação, principalmente por seu efeito vasodilatador. O que a cafeína faz é impedir a ação da adenosina, dando um “gás” à atividade neural (o que pode deixar a pessoa mais alerta) e provocando a contração dos vasos sanguíneos, o que parece contribuir com uma pequena elevação da taxa metabólica basal. Ressalta-se que esse bloqueio ocorre mesmo com doses baixas de cafeína, conseguida através de uma xícara de café.
2. Mobilização do cálcio nas células: a cafeína pode levar a um aumento da concentração de cálcio no músculo, o que poderia aumentar a contratilidade muscular.
3. Inibição das fosfodiesterases: as fosfodiestares são enzimas que degradam um mediador químico, chamado AMP cíclico, que participa de várias reações no nosso organismo, como aumento da oxidação de ácido graxos livres (aumentando a taxa metabólica basal) e estímulo à lipólise (“quebra de gordura”). Assim, inibindo as fosfodiesterases, o AMP cíclico fica mais tempo em circulação e seus efeitos são prolongados. Esse mecanismo também parece ocorrer apenas com doses elevadas de cafeína
4. Aumento da oxidação de ácidos graxos: o aumento da lipólise (“quebra de gordura”) faz com que sejam modificadas as fontes de utilização de energia no corpo, diminuindo a utilização de glicogênio e aumentando a oxidação de ácidos graxos. 

QUEM TERIA INDICAÇÃO DE USAR CAFEINA COMO SUPLEMENTO?
Para começar é importante lembrar que não existe nenhuma indicação do uso de cafeína como tratamento para obesidade. A literatura científica tem demonstrado que a cafeína pode ser um suplemento esportivo eficaz, mas vai depender muito da condição e desempenho do atleta, bem como do tipo, intensidade e duração da atividade física. A cafeína pode ser benéfica em doses baixas a moderadas (dose máxima segura parece ser de 5 mg/kg), porém não há evidencia para seu uso em doses altas (≥ 9 mg/kg), pois os efeitos colaterais com essas doses são maiores do que os benefícios. Estudos mostram que a cafeína pode ser eficaz em exercício prolongado e de alta intensidade (incluindo esportes em equipe, como futebol, rugby; ou corridas de aventura e triátlon de longa distância), mas a melhora do desempenho é específica para cada atleta. Alguns estudos, inclusive, demonstram a redução da força e rendimento quando indivíduos não treinados fazem uso de cafeína. Ela também é eficaz em aumentar a vigilância e reduzir a percepção da dor e da fadiga da contração muscular durante períodos prolongados de exercício exaustivo. Quanto aos esportes de força-potência, como musculação, a literatura é inconsistente para indicar uso de cafeína nessas situações.

MAS E OS RISCOS E OS EFEITOS ADVERSOS DO USO DA CAFEÍNA?
A cafeína possuiu diversos efeitos colaterais, entre eles:
- Aumento do risco de palpitações e arritmias cardíacas grave.
- Aumento da vasoconstrição das artérias, inclusive nas artérias do coração que, em indivíduos suscetíveis, pode levar ao aumento do risco de infarto cardíaco. Também pode provocar aumento da pressão arterial, mesmo naqueles indivíduos com pressão arterial prévia normal.
- Aumento da produção de ácidos do estômago, piorando gastrite e propiciando a formação úlceras.
- Transtornos psiquiátricos, agitação, irritabilidade, ansiedade.
- Redução e piora da qualidade do sono.
- Se intoxicação aguda: náuseas, vômitos, crises convulsivas e edema cerebral, com risco de morte
- Risco de abuso (quando há uma necessidade incontrolável de consumir cafeína) e dependência (quando aparecem mecanismos de tolerância ou sinais de abstinência na ausência da substância).

RESUMINDO...
1. Existe evidências de que a cafeína aumenta a taxa metabólica basal por aumento da termogênese, porém esse aumento da taxa metabólica não se expressa em uma perda de peso significativa, logo, cafeína não deve ser usada para a perda de peso.
2. A utilização de cafeína em doses baixas a moderadas parece ser segura e pode ter algum benefício dependendo do tipo do exercício (normalmente os prolongados e de alta intensidade, como futebol ou triátlon), duração da atividade física e do preparo do próprio atleta. 
3. Como qualquer suplemento esportivo, a cafeína não está indicada para qualquer praticante de atividade física!! Seu uso deve ser feito apenas com orientação profissional, de forma criteriosa e com a prescrição baseada no tipo de exercício, intensidade, duração e preparo do atleta. 

REFERÊNCIAS:
1. International society of sports nutrition position stand: caffeine and performance. Erica R Goldstein1, Tim Ziegenfuss2, Doug Kalman et al.
2. Livro Suplementação Alimentar na Prática Clinica – SBEM. 1ª edição.

Dra. Fernanda Meneghini Fleig
Médica Endocrinologista e Metabologista
CREMERS 33785 / RQE 28970

sábado, 14 de janeiro de 2017

Vitamina D e Gestação

A vitamina D é tradicionalmente associada à manutenção da saúde óssea da população. Entretanto, diversos órgãos e sistemas do corpo podem sofrer influência da vitamina D. Nos últimos anos, diversas funções não-esqueléticas vêm sendo atribuídas a esta vitamina. Neste contexto, encontra-se o efeito da vitamina D para a saúde da gestante e do bebê.
Durante a gravidez, diversas adaptações ocorrem no corpo da mulher com vistas a disponibilizar cálcio para o desenvolvimento dos ossos do feto. Essas adaptações são, ao menos em parte, mediadas pela vitamina D materna. Desta forma, mulheres sem estoques adequados de vitamina D na gestação podem encontrar dificuldades em manter o equilíbrio do metabolismo do cálcio.



A dosagem de vitamina D NÃO está indicada para toda população, mas deve ser realizada em grupos específicos, os quais incluem as gestantes e as lactantes (mulheres que estão amamentando). A dosagem da 25-hidroxivitamina D é o exame a ser avaliado, já que é a forma predominante de vitamina D circulante, além de ser o melhor indicador dos estoques corporais. Valores de 25-hidroxivitamina D iguais ou acima de 30 ng/mL são considerados normais, enquanto valores entre 20 e 29 ng/mL indicam insuficiência e valores abaixo de 20 ng/mL refletem a deficiência desta vitamina.
A prevalência de deficiência de vitamina D na gestação é bastante elevada em todo o mundo e também no Rio Grande do Sul. Dados publicados em 2014, referentes a gestantes com diabetes gestacional de Porto Alegre, mostram que apenas 13,6% das mulheres apresentavam vitamina D em níveis considerados adequados. Como o feto depende da vitamina materna, a deficiência/insuficiência de vitamina D também é muito frequente nos recém-nascidos.
As repercussões da deficiência de vitamina para o feto e para a gestante foram estudadas nos últimos anos. Sabemos que, para o bebê, as consequências podem ser o aumento do risco de baixo peso, prematuridade, alteração do metabolismo ósseo e infecções pulmonares. Para a mãe, as consequências são o aumento do risco de pré-eclâmpsia e de diabetes gestacional. Outras doenças também vêm sendo estudadas em sua relação com a vitamina D mas sua associação ainda não está completamente esclarecida.
Frente ao grande números de gestantes com deficiência de vitamina D, e suas repercussões na saúde tanto da mãe quanto do feto, a reposição durante a gestação vem sendo recomendada. Estudos apontam que o tratamento pode reduzir as taxas de parto prematuro, baixo peso ao nascer e pré-eclâmpsia. A dose necessária para normalizar a vitamina D durante a gestação pode chegar a 2000-4000 unidades ao dia, porém deve ser individualizada para cada mulher. Esta reposição, quando feita pelo médico obstetra ou endocrinologista, é considerada segura para a mãe e para o bebê.

Referências:
1 - Holick MF, Binkley NC, Bischooff-Ferrari HA, et al. J Clin Endocrinol Metab 2011;96:1911-30.
2 - Weinert LS, Reichelt AJ, Schmitt LR, et al. Am J Hypertens. 2014 Oct;27(10):1316-20. 
3 - Weinert LS, Silveiro SP. Matern Child Health J. 2015 Jan;19(1):94-101. 
4 - De-Regil LM, Palacios C, Lomardo LK and Peña-Rosas JP. Cochrane Database of Systematic Reviews 2016, Issue 1. Art N CD008873.

Dra. Letícia Schwerz Weinert
Médica Endocrinologista
CREMERS 29.996 - RQE 21.442

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

O papel da lorcaserina no tratamento medicamentoso do excesso de peso

No final de 2016, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) deu aval positivo para um novo medicamento inibidor do apetite, a lorcaserina. Desde 2012, a lorcaserina já está disponível para tratamento do excesso de peso nos Estados Unidos. O medicamento está indicado como adjuvante a medidas de mudança no estilo de vida (reeducação alimentar e atividades físicas) em pacientes com índice de massa corporal (IMC) maior ou igual a 30 kg/m2, isto é, com diagnóstico de obesidade. Pacientes com sobrepeso acompanhado de comorbidades como diabetes mellitus tipo 2, elevação do colesterol e apneia do sono também são candidatos ao tratamento quando o IMC for maior ou igual a 27 kg/m2.



Farmacologicamente, a lorcaserina é considerada um agonista seletivo do receptor 2C da serotonina. Tanto em animais quanto em seres humanos, a interação da serotonina com o receptor 2C é capaz de diminuir o apetite. Agonista é uma molécula que "finge" ser outra, isto é, a lorcaserina "finge" ser serotonina para poder interagir com o receptor 2C e diminuir o apetite. outros agonistas da serotonina, como a fenfluramina e a dexfenfluramina, já foram usados como inibidores do apetite no passado. No entanto, acabaram sendo retirados do mercado pois causavam doenças nas válvulas do coração. Esse efeito adverso ocorria porque a fenfluramina/dexfenfluramina NÃO eram agonistas específicos do receptor 2C. Isto é, interagiam também com os receptores 2A e 2B da serotonina. E a interação com o receptor 2B parece ser a responsável pelos problemas cardíacos.
A lorcaserina tem um perfil de tolerabilidade bom. Entre os efeitos adversos mais frequentes estão dor de cabeça, tontura, náusea e dor nas costas. Nos estudos disponíveis até o momento, que duraram até 2 anos, seu uso não causou problemas ao coração. Por sinal, a lorcaserina ajudou a baixar a pressão arterial, os níveis de colesterol LDL (ruim) e de glicose.
Quanto ao efeito sobre o peso, não é um medicamento dos mais potentes. A redução costuma ser discreta: média de 3 a 4 quilos quando comparada ao placebo (comprimido sem efeito). Além disso, muitos dos pacientes que começaram os estudos clínicos abandonaram o tratamento antes do final. Ou seja, na vida real, o resultado pode ser ainda menor. No maior estudo, 5 em cada 10 pacientes que usaram a lorcaserina perderam pelo menos 5% do peso. Já entre os pacientes que tomaram placebo, 2 em cada 10 conseguiram perder pelo menos 5% do peso.
A lorcaserina é contraindicada em pacientes com comprometimento grave da função renal, em gestantes e em pacientes que façam uso de outros medicamentos que ajam sobre a serotonina.
Apesar de estar aprovado pela ANVISA, a lorcaserina ainda não está disponível nas farmácias. Possivelmente será lançado no decorrer do ano de 2017. Aguardemos!

Referência:
1- Smith SR, Weissman NJ, Anderson CM, Sanchez M, Chuang E, Stubbe S, Bays H, Shanahan WR, Behavioral Modification and Lorcaserin for Overweight and Obesity Management (BLOOM) Study Group. Multicenter, placebo-controlled trial of lorcaserin for weight management. N Engl J Med. 2010;363(3):245. 

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Refrigerante, o novo cigarro

Nossa! Quanto exagero comparar refrigerantes, ou mesmo outras bebidas açucaradas, ao cigarro. Será mesmo? Vamos entender o porquê desta comparação “maluca”...
Neste ano de 2016, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendou aumentar os impostos sobre refrigerantes e outras bebidas doces em pelo menos 20 por cento. Prontamente, o governo do Reino Unido anunciou aumento de impostos para os refrigerantes a partir de 2017. Como bons brasileiros, sempre temos um pé atrás com aumento de tributos. Mas a Universidade de Oxford fez uma análise estatística do impacto desta medida para os ingleses: o aumento de 20% no preço, levaria a redução na ingestão de açúcar (sim, refrigerantes contêm muito açúcar) de 15%. Esta pequena diminuição no consumo já seria capaz de prevenir que 180 mil pessoas se tornassem obesas em 1 ano! Sem falar num número ainda maior de pessoas que deixariam de engordar (1).



Se o problema se restringisse apenas ao peso... mas diferentes estudos associam o consumo excessivo de açúcar ao aumento na incidência de diabetes mellitus, mesmo em pessoas com peso normal. Além disso, independentemente do índice de massa corporal e do grau de atividade física, quem consome mais açúcar corre um risco maior de morrer de doenças cardíacas e vasculares (2).
Mas se o problema é o açúcar, por que culpar só os refrigerantes? Por dois motivos muito importantes: 1- os refrigerantes são responsáveis por cerca de 1/3 de todo o açúcar consumido. 2- a indústria destas bebidas tenta de toda forma esconder o quanto o “refri” faz mal à sua saúde.
Desde que os primeiros estudos correlacionando o fumo ao câncer de pulmão foram publicados, demorou cerca de 50 anos até que políticas públicas de restrição de consumo fossem plenamente implementadas. No início, a indústria do tabaco esperneou negando a associação do seu produto com doenças, lançando dúvidas para confundir o público e, pior, comprando a lealdade de cientistas e políticos corruptos. Apesar disso, nas últimas 3 décadas, a redução do tabagismo preveniu muitas mortes por câncer e doenças cardiovasculares.
A indústria do refrigerante não fez diferente: tentou associar a epidemia de obesidade, diabetes e doenças vasculares ao consumo de gordura e à inatividade física, isentando o açúcar. Nesse processo, cientistas e políticos também foram corrompidos. Por fim, esta indústria está lavando as mãos e dizendo que a responsabilidade por optar pelo produto pouco saudável é sua, o consumidor!
A verdade é que a briga está apenas começando... Assim como no combate ao fumo, além de impostos mais altos, as bebidas doces (refrigerantes, sucos processados, néctares, isotônicos, etc) precisam ter a publicidade devidamente regulada e serem desvinculadas de atividades saudáveis como esportes. Isso salvou vidas no passado e vai salvar mais vidas no futuro. Se o refrigerante realmente é o novo cigarro, vamos começar a tratá-lo desta forma!

Fontes:
1- Briggs ADM, Mytton OT, Kehlbacher A, et al. Overall and income specific effect on prevalence of overweight and obesity of 20% sugar sweetened drink tax in UK: econometric and comparative risk assessment modelling study. BMJ. 2013;347:f6189. 
2- Yang Q, Zhang Z, Gregg EW, Flanders WD, Merritt R, Hu FB. Added sugar intake and cardiovascular diseases mortality among US adults. JAMA Intern Med. 2014;174:516-524. 
3- Aseem Malhotra. Sugar Is the New Tobacco, so Let's Treat It That Way. Medscape Public Health.

Dr. Mateus Dornelles Severo
 Médico Endocrinologista
CREMERS 30.576 - RQE 22.991